sexta-feira, 13 de julho de 2012

Bambueiro.


FILHOTE DE CANGURU

Deolino Pedro Baldissera


 
Os cangurus quando nascem vão direto para o marsúpio (bolsa na barriga da mãe). Eles nascem imaturos e precisam dessa proteção para se desenvolver. Ali eles mamam e são protegidos. Ficam escondidos ali até mais ou menos dois meses, ai começam a aparecer com a cabecinha para fora, saltitam buscando alimento na relva próximo da mãe. Em torno de um ano deixam definitivamente bolsa materna, começando a ter vida independente e aos poucos se tornam adultos, convivem com os outros cangurus assumindo os papéis próprios dos cangurus adultos. São inofensivos. Só atacam quando se sentem ameaçados.

              Em alguns aspectos nós humanos somos parecidos aos cangurus. Também nós quando nascemos precisamos dos cuidados maternos, leite, proteção, afeto. Normalmente a criança se alimenta da mãe durante 6 meses e aí começa a receber alimento mais sólido até que não necessitar mais do peito da mãe. Deixa de mamar, mas continua precisando da proteção e afeto até ficar adulto. Na medida em que cresce vai adquirindo mais autonomia, passada a adolescência, assume papéis e responsabilidades e convive nos grupos sociais interagindo como adulto. Esse deveria ser o processo normal e é o esperado pelos demais. Contudo no dia-a-dia há muitas pessoas adultas em idade, mas comportam-se e continuam como cangurus bebê, não conseguem viver independentes do “colo” materno. Buscam pessoas que lhe façam às vezes de mãe babá permanente. Suas relações são marcadas por apegos exigentes e permanecem infantis na sua busca de proteção e afeto.  Não amadurecem afetivamente. São homens, mulheres, em idade cronológica adultos, exercendo papéis de adultos, são responsáveis, tem competência profissional e não entanto na parte emotiva afetiva comportam-se como crianças! Não amadureceram e reagem às desatenções com atitudes que destoam do comportamento esperado. Continuam na dependência dos cuidados “maternos” como cangurus que não conseguem abandonar o marsúpio. Essas situações aparecem em diferentes formas de conduta. Há pessoas que abrem mão de sua autonomia, renunciam a uma personalidade própria, contanto que alguém se encarregue de cuidá-las, são dependentes. Há outros que de modo mais disfarçado procuram dominar outras pessoas para tê-las a seu serviço, comprando o afeto com favores e outras formas de recompensa. Há também aqueles tentam nutrir sua afetividade imatura com chantagens emocionais ou mesmos com doenças. Há ainda aqueles que se fecham num mundo a parte como solitários desligados da vida dos demais. Outros tantos reagem às frustrações afetivas com vitimismos escandalosos chamando atenção pelo exagero de suas “dores”. Muitas outras formas poderiam ser elencadas. Esses exemplos ilustram o quanto a questão afetiva é importante no processo de crescimento e amadurecimento. Nas questões afetivas a maturidade não se mede pelo número de anos que a pessoa tem. Uma pessoa de 50 anos pode ser mais imatura do que uma de 25. Em geral a causa do problema se encontra nas interações mal dosadas  do início da vida. E nesse período em que os desequilíbrios começam e a responsabilidade maior recai sobre os “cuidadores”, isto é, as pessoas mais significativas na vida da criança, (mãe/pai ...). O aspecto afetivo é determinante para o equilíbrio de relações sadias. Criança mal amada em geral será adulto problemático. Cuidar bem delas enquanto elas não sabem se auto gestir, é garantir-lhes a possibilidade de serem adultos independentes capazes de convívio sadio com os demais. Os filhotes de cangurus quando adultos não precisam mais do marsúpio, porque aos poucos aprenderam a cuidar de si como independentes, mantendo-se em comunhão com seu grupo. Na medida em que cresciam seus “pais” deixavam que vivessem suas vidas, integrando-se como adultos na sociedade dos cangurus. Quem sabe nós humanos poderíamos aprender algo com os cangurus, para nos tornamos pessoas maduras não só no tamanho físico e na competência profissional, mas também nas relações sociais equilibradas, sem muitos subterfúgios que atrapalhem a autonomia sadia e permita um convívio mais harmonioso com os demais.

processo de desenvolvimento identidade pessoal


PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DA IDENTIDADE PESSOAL

                                           Deolino Pedro Baldissera, sds

Introdução:

A identidade pessoal é algo que nós vamos construindo na medida em que vamos crescendo e tomando consciência de quem somos e o que queremos da vida. Ninguém nasce pronto, nós vamos aprendendo a ser gente na medida em que vamos convivendo com os outros, e vamos descobrindo nossas inclinações e nossos gostos, bem como nossas limitações.

1.         Situando o problema da identidade.

         O desenvolvimento da identidade pessoal ocorre durante um longo processo que se inicia nos primeiros anos de vida, quando a criança começa a distinguir-se dos outros objetos e pessoas. Começa a se perceber diferente dos demais. Lá pelos 2-3 anos, quando começa a falar e andar, começa a referir-se a si própria apontando com o dedo para si quando alguém lhe pede para mostrar quem é a pessoa que tem seu nome. É uma identidade ainda rudimentar, principiante, mas que lança as primeiras bases para a construção de uma identidade mais definida que vai ocorrer no período da adolescência e início da juventude. Ela estará consolidada e bem definida quando o jovem é capaz de governar-se e orientar-se pelas próprias convicções, e ter formado um quadro referencial de reconhecimentos e de aceitação dos próprios limites, ao mesmo tempo em que respeita as diferenças que percebe nos outros. Tem um senso de autonomia e independência

2.     A subjetividade e a individualidade como fatores básicos da identidade pessoal.

         Dois elementos inseparáveis na formação e consolidação da própria identidade vêm com a conquista da subjetividade e individualidade. Por subjetividade aqui entendemos todos os processos interiores de pensamentos e sentimentos (razão e emoção), mormente os emotivos, que dão uma tonalidade à maneira de ser do sujeito, que o distinguirá dos demais. Sua subjetividade se manifestará na maneira como lida consigo mesmo, como reage diante do mundo externo, como este se reflete em seu interior e como maneja suas emoções na forma de expressá-las ou reprimi-las. A subjetividade diz respeito, portanto, ao seu modo pessoal de interpretar o que acontece dentro de si e como percebe o mundo que entra em si e com o qual se põe em relação. Ao mesmo tempo em que vai tomando consciência de sua subjetividade também vai se apoderando de sua individualidade vendo-se como sujeito de sua história pessoal e sua unicidade irrepetível. Essas aquisições da subjetividade e da individualidade não ocorrem espontaneamente com o crescimento. Vários fatores podem favorecer ou dificultar esse processo ou mesmo impedir que se complete com relativo sucesso.

         São freqüentes os casos de pessoas que mostram pouco senso de autopertença e percepção realista de quem realmente são. Há os casos mais sérios em que a identidade nem chega a se formar. Como se vê, a formatação da identidade pessoal com os componentes subjetivos e individuais integrados não é decorrência lógica do crescimento biológico e etário.é um processo complexo que envolve o sujeito como um todo.

  1. A pessoa em desenvolvimento – momentos-chave da construção da identidade.

         Hoje, graças especialmente às ciências humanas e biológicas e de modo particular à psicologia, sabemos que o sujeito humano, desde seu nascimento, percorre fases que o caracterizam em momentos específicos de seu crescimento. Por exemplo, nos dois primeiros anos de vida ele deve percorrer o caminho da separação objetal até chegar a estabelecer uma relação realista com o mundo fora dele. Em outras palavras, o bebê não conhece as pessoas, não sabe distinguir quem é quem. Só na medida em que cresce vai descobrindo quem cuida dele, seus brinquedos etc. Ao nascer não consegue distinguir-se das demais coisas/objetos que o cercam. Nos dois primeiros meses nem mesmo a mãe ele consegue ver como diferente de si, por isso vai ao colo de qualquer um e não estranha. É a fase do autismo, ele e o mundo são uma só coisa. Alguns meses depois já começa a perceber o outro como diferente de si, porém não consegue viver sem o outro ainda unido a ele. É a fase simbiótica onde o eu do outro é seu eu auxiliar. Superada essa fase consegue ver o “mundo externo” dividido em duas partes - o bom e o mau, porém separados. Ou tudo bom ou tudo mau. Estabelece uma cisão. A mãe é boa quando gratifica suas necessidades, a mãe é má quando não o atende. Só em torno de um ano e meio a dois anos consegue fazer a integração dos dois aspectos no mesmo objeto. O bom e o mau podem conviver juntos. Se esse processo não se conclui de forma satisfatória pode ocorrer que o indivíduo se fixe numa visão ou otimista demais (idealizações fantasiosas) desconectando-se da realidade objetiva e vivendo como que no “mundo da lua”, ou então, assume uma visão (com tão) pessimista, negativista diante da vida. Mesmo que o dia amanheça ensolarado e radiante, vai logo se preocupar com a possibilidade de à tarde chover e estragar tudo! Conseqüências dessa visão distorcida da realidade afetam suas relações com os outros e comprometem o próprio sucesso diante da vida.

         Esses processos iniciais abrem caminho para a primeira identificação da criança que aprende a se distinguir dos demais objetos e começa a manifestar seus desejos e como quer ser quando crescer. Em geral, seus desejos identificatórios são de fazer o que o pai ou mãe fazem ou outra pessoa que lhe seja próxima afetivamente. Passa a imitá-las em algumas atitudes até mesmo copiando, às vezes, tiques. Nesta fase a imaginação e a fantasia predominam nas relações com os objetos e fazem-no ser capaz de ter os próprios sonhos de futuros que são embriões de futuros ideais mais realísticos. Com o despertar da curiosidade que o leva a querer saber os “porquês” de tudo o que lhe dizem. Vai amadurecendo, assim, no aprendizado interacional com as outras crianças e seu companheirismo reconhecendo as semelhanças e diferenças entre si, e aceitando conviver com gostos e opiniões divergentes das suas. Essa assimilação que se dá, sobretudo nas relações lúdicas, brincadeiras e nas trocas de experiências, o conduz a uma maior definição de sua própria identidade que ocorre na fase da adolescência. Nela, a aquisição da autonomia vai marcá-la como alguém independente e dona do próprio nariz. É bem verdade que ainda com prepotência e inseguranças misturadas, mas já sendo capaz de testar-se no confronto com os adultos que o querem submeter. Já não veste as roupas que a mãe quer ou separa para ele. Ele próprio põe aquelas que acha que mais lhe convêm, independente das convenções sociais dos adultos. Prefere identificar-se com seus ídolos porque estes lhe oferecem um retrato que quer desenhar para si como homem ou mulher independente, autônomo. Passada a adolescência, evolui para uma maturidade da própria identidade em que assume mais realisticamente a vida a partir de escolhas que faz e as assume com responsabilidade seja no mundo profissional como no afetivo. Define-se por uma profissão, é capaz de produzir bens e geri-los e de comprometer-se com alguém com quem quer compartilhar sua vida afetiva na forma de constituição de família ou optando por uma instituição cujos ideais o atraem, e ele os abraça também como seus e se “casa” com eles.

O processo de construção da identidade é complexo, mas necessário para que alguém se sinta ele  próprio, com suas aptidões e suas limitações.

Referencias bibliográficas.

MUSSEN, P.H., COGER, J.J. KAGAN, J.,Huston A.C., Desenvolvimento e personalidade da Criança. São Paulo: Editora harbra, 1988

GRIFFA, M.C., MORENO, J.E., Chaves para a psicologia do desenvolvimento. SÃO PAULO: Paulinas, 2001, tomo I e II.

BALDISSERA, D.P., De quem sou  eu? Para quem sou... São Paulo: Paulinas, 1999.